Massimo Manzolillo* |
Os efeitos da crise revelaram um país, extra-oficialmente, parlamentarista – a cena política trepidando sem afetar instituições que se mostraram firmes e uma economia resistente a escândalos. Para o vice-presidente da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), Miguel Ribeiro, na história do Brasil nunca houve um período de tanta instabilidade política em que a economia funcionou de modo tão sólido. Ele alerta, todavia, que ainda não se pode comemorar. “Vamos ver que seqüelas teremos após o pico da crise, que deve ocorrer com o andamento dos trabalhos da CPI”, observa ele. Na opinião do economista, fatalmente haverá riscos econômicos caso as denúncias atinjam de fato o primeiro escalão federal. Publicidade
“Se essas questões respingarem no presidente da República, o país reviverá a alta do dólar e a evasão de investimentos”, previu. Para se resguardar, o governo demonstrou uma reação mais sistemática no campo econômico, anunciando que estuda um maior aperto fiscal e a desvinculação do orçamento. Leia também Publicidade
Mas o presidente do Instituto Brasileiro de Estudos Políticos (Ibep), Walder de Góes, afirma que essas medidas não determinam a dinâmica da crise. “São movimentos importantes, mas o futuro do governo Lula depende, agora, da investigação parlamentar, nas trilhas abertas por Jefferson", afirma. PublicidadeA análise do jornal inglês Financial Times, publicada no último fim de semana, descreve um país estabilizado, com uma moeda consistente frente ao dólar, mas com um governo refém da base parlamentar. Para o correspondente Raymond Colitt, se Lula abrir mão do apoio centrista do PL e do PP, poderá tornar-se um “presidente meramente decorativo”, sem maioria no Congresso Nacional. A sombra do impeachment Pilares abalados no quadro político, uma fundação sólida no cenário econômico. A mesma crise, conseqüências distintas. Se as denúncias de corrupção em órgãos públicos e de pagamento de mesada a parlamentares da base governista não provocaram mudanças abruptas na economia do país, sacudiram de tal forma os três Poderes que a perda de credibilidade e a instabilidade do governo podem transformar um fantasma do passado, o impeachment, em um fato do presente ou do futuro próximo. A avaliação é de Walder de Góes, que chama a atenção para a falta de uma estratégia afirmativa, por parte do Executivo, para lidar com o problema. “Esse é um fator claro do agravamento. Os fatos se sucedem, mas o presidente segue ao largo, sem produzir decisão política mais contundente que altere o rumo”, analisa. Dessa maneira, segundo ele, o risco maior de qualquer processo de instabilidade política, o impeachment, não pode ser afastado. Enquanto as mudanças ministeriais enveredam pelo sinuoso labirinto dos debates, as fontes originais da turbulência seguem perigosamente próximas do presidente da República, destaca o cientista político. “Novas revelações podem ser feitas, com a possibilidade de envolvimento de auxiliares da Presidência da República. Dependendo do conteúdo delas, será difícil alegar, sem efeitos colaterais, que o presidente nada sabia”. Em meio a essa letargia, ressalta, a oposição jogará com a carta do impeachment. O rumo das investigações Publicamente, explica, partidos como PSDB e PFL prometem moderação e responsabilidade. No dia-a-dia das investigações, buscam estender ao máximo o processo de desgaste do governo, até o ponto em que seja realmente necessária a colaboração deles para proteger o mandato presidencial. “Todos sabem, entretanto, que nem governo nem oposição têm condições de controlar uma investigação cujos lances mais importantes ocorrem na mídia, fonte original das revelações. Nessa crise, também a postura moderada da oposição é instável", afirma. Sobre o aspecto desidratado das provas produzidas até aqui, Walder de Góes diz que o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) ofereceu pistas cujo significado político foi imediatamente compreendido. Ele enfatiza que, em breve, os sigilos parlamentares serão quebrados, ampliando a lista de alvos: "Pode demorar até surgir uma forte evidência. Mas, se realmente houve o esquema do mensalão, é praticamente impossível que uma investigação sistemática não revele alguma coisa. Após tantas negativas, essa confirmação enfraqueceria definitivamente o governo Lula". Do ponto de vista técnico, o cientista avalia que as investigações têm um foco muito preciso – a relação do publicitário Marcos Valério com o governo Lula e com o PT e contas no Banco do Brasil e no Banco Rural. Na contra-ofensiva, José Dirceu, ex-chefe do Gabinete Civil, disse não ser tão importante a reforma ministerial. “Nessa cena, é coerente manter o diagnóstico da semana passada. A sombra do impeachment não pode ser desconsiderada, ainda que deva funcionar mais como elemento de cálculo político que como desfecho provável da crise”, finaliza Góes. * Colaborou Lenilton Costa |
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