O Diretório Central dos Estudantes da Universidade de Brasília (UnB) é batizado com o nome de Honestino Guimarães. Honestino era comunista, ligado à Ação Popular (AP), movimento que congregava a ala de esquerda da Igreja Católica, onde militou também o candidato derrotado do PSDB à Presidência da República, José Serra, e o primeiro reitor democraticamente eleito da UnB, o hoje senador Cristovam Buarque (PDT-DF). Honestino foi arrancado pelas botas da ditadura de dentro da própria universidade. Preso, desapareceu. Ela dá o nome ao DCE da UnB por ser o símbolo máximo da resistência estudantil à ditadura militar. Durante o regime militar, a universidade foi invadida duas vezes pelas forças da repressão. Viveu anos sob o jugo de um interventor, o capitão-de-mar-e-guerra José Carlos Azevedo. Para qualquer estudante das gerações anteriores da UnB, contemporâneos de Honestino ou partícipes da luta pela redemocratização após a saída de Azevedo e a eleição de Cristovam, na semana passada aconteceu o impensável na universidade: o diretório batizado com o nome do esquerdista Honestino Guimarães tem agora uma diretoria de direita.
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Apesar de rejeitar o rótulo de direita, o grupo não tem medo de se declarar conservador e reconhecer, pelo menos, que “não é de esquerda”. Desde a redemocratização do país, é a primeira vez que um grupo com essas características dirigirá o diretório que representa os estudantes da universidade. Apesar de ter tido apenas 22,13% dos 5.786 votos em turno único, a Aliança pela Liberdade foi uma “voz dissonante” dentre as outras sete chapas que também concorriam, todas de orientação declaradamente de esquerda, e com vínculos partidários. Todos se perguntam, perplexos: o que aconteceu?
Mas quem vem acompanhando os movimentos recentes na UnB não se surpreendeu tanto com o que aconteceu. “Esta eleição não foi de todo uma supresa”, diz o ex-coordenador geral do DCE na gestão passada e hoje cientista político, Raul Pietricovsky Cardoso. Os primeiros sinais de que algo diferente poderia acontecer na UnB começaram depois das pesadas denúncias que derrubaram o ex-reitor Thimothy Mulholland. Thimothy usou os recursos da UnB para comprar e mobiliar um apartamento de alto luxo para ele. Ficaram famosos os preços de alguns dos artigos comprados para o apartamento: lixeira de R$ 1 mil; saca-rolhas de R$ 895; liquidificador de R$ 495. Indignados, os estudantes invadiram a reitoria e Thimothy acabou deixando o cargo. Foi no movimento de invasão da reitoria que nasceu a Aliança pela Liberdade.
Para a escolha do atual reitor, José Geraldo de Souza Júnior, houve uma mudança significativa no método utilizado na eleição. Antes, havia um modelo que dava mais peso aos professores. Na eleição de José Geraldo, optou-se pelo voto paritário, com o mesmo peso para professores, estudantes e funcionários. Alguns acreditam que, no modelo anterior, José Geraldo poderia ter perdido para um outro professor, Márcio Martins, que apoiou a invasão da reitoria pelos estudantes e condenou Mulholland. O caldo, assim, ia engrossando.
A atual diretoria da Associação dos Docentes da UnB (Adunb), antes da eleição agora do diretório dos estudantes, também já fazia oposição à atual reitoria. Alguns professores reclamam que a condução de José Geraldo privilegiaria politicamente alguns grupos entre os professores. A diretoria da Adunb aplaudiu a eleição do novo DCE. “Isso evidencia uma pluralidade de ideias e pensamentos dentro da academia, o que é salutar. Entendemos também que é importante para a oposição se manter firme em suas ideias e que possam também aprender com essa experiência”, diz o presidente da Adunb, Ebnézer Nogueira, no site da instituição, sobre a eleição do DCE.
Pulverização
Se, portanto, havia a situação iniciada na invasão da reitoria e na insatisfação de alguns professores, facilitou ainda a vitória da chapa Aliança pela Liberdade a pulverização dos grupos ligados aos partidos de esquerda na universidade, um reflexo do que aconteceu depois que o PT chegou ao poder. PT, PCdoB, PDT, PSB, PSTU, Psol, PCO, PSB, cada um saiu com uma chapa diferente. Havia sete chapas diferentes de esquerda contra a Aliança pela Liberdade. “O grupo da Aliança já vinha com resultados crescentes e se beneficiou dessa pulverização”, avalia Raul Pietricovski Cardoso.
“A discussão sobre relações com partidos sempre esteve presente nas campanhas. Mas a preferência dos alunos por um grupo não vinculado a nenhum partido faz parte de um debate que está acontecendo na sociedade”, afirma Raul. A não partidarização é também uma característica das Marchas contra a Corrupção, que levaram mais de 40 mil pessoas às ruas nos dias 7 de setembro e 12 de outubro. Na solenidade de posse, na última terça-feira (1), todos os integrantes apresentaram documentos do Tribunal Superior Eleitoral que atestam a não vinculação a nenhum partido.
Assim como outros movimentos sociais que rejeitam a participação dos partidos, a chapa eleita aproveitou esse diferencial para angariar mais votos.
“Sabemos que a vinculação partidária é normal na universidade, mas o brasileiro já está cansado. A sociedade quer mostrar sua cara nas ruas como indivíduos, pois sabem que os partidos acabam capturando os movimentos para si”, afirma André Maia, estudante de Direito, um dos fundadores da Aliança pela Liberdade.
No entanto, o grupo não é contrário a existência dos partidos. “Os partidos políticos são imprescindíveis para o processo democrático. Mas não precisamos vincular todas as atividades políticas a eles. Podemos ser politizados, mas não precisamos ser necessariamente partidarizados”, disse.
Objetividade
Sem a vinculação partidária, os estudantes que venceram o DCE beneficiaram-se também de uma discussão que domina já há algum tempo o movimento estudantil: um certo descolamento dos grupos tradicionais do movimento estudantil dos reais anseios dos estudantes de hoje. Longe de bandeiras tradicionais da esquerda, a chapa Aliança pela Liberdade tratou de problemas mais concretos dos estudantes.
Tal objetividade chamou a atenção de alunos que, tipicamente, não se envolvem com questões do movimento estudantil. A Faculdade de Tecnologia (FT) era sempre uma das mais ausentes nesse debate. No ano passado, menos de 20% dos alunos votaram na eleição para o DCE. Neste pleito, quase 60% desses estudantes compareceram às urnas. A chapa ganhou os votos, principalmente dos estudantes das engenharias, direito, economia, agronomia, administração e estatística, que este ano participaram em massa. “A característica desses alunos é de desmobilização, mas não de despolitização. O grupo que venceu o pleito é completamente legítimo. Eles não querem ver a universidade como um partido. Para eles, a função dela é ser mais neutra, mais focada na produção acadêmica e na relação com o mercado de trabalho”, explica o cientista político Leonardo Barreto.
Não será fácil
Nada indica, porém, que a vida da nova diretoria do DCE será fácil. Primeiro, uma vez que eles receberam pouco mais de 22% dos votos, fica claro que a maioria dos que votaram é contrária a eles. Além disso, como o voto é facultativo, houve alta abstenção.
Antes mesmo de assumirem a gestão, os integrantes da chapa 8 sentiram na pele a forte oposição que enfrentarão no próximo ano. Ainda na noite da contagem dos votos, estudantes contrários protestavam aos gritos de “eles não nos representam” em um auditório da universidade. O resultado também proliferou nas redes sociais, com manifestações a favor e contra a nova corrente política. “A vida deles não será tão fácil à frente desta gestão, porque a oposição estará muito bem organizada e eles não terão uma base forte, muito pela característica de seus eleitores, que são mais desmobilizados”, diz Leonardo Barreto.
“Apesar de os grupos tradicionais estarem raivosos com a gente, a aceitação está sendo enorme na universidade. Estamos sendo parabenizados diariamente, além de estarmos recebendo apoio de todas as partes da UnB, como de professores e funcionários”, explica André Maia. Para ele, algumas chapas agem de forma reacionária. “Acho que a oposição está esbravejando porque perdeu o osso de sempre. Eles acham que podem vencer no grito, mas nossa luta é no plano das ideias”, disse.
Rótulos
Apesar de serem classificados pelas outras chapas como militantes da direita, o grupo prefere não se rotular. Apenas dizem ser a “não-esquerda”. “O que posso afirmar é que somos realistas e pragmáticos. Podem nos chamar do que quiserem, mas somos um grupo de pessoas livres”, esclarece André.
Outro ponto fundamental para a vitória da chapa, foi o descrédito com que os outros concorrentes os trataram. A maioria dos grupos tentou desestabilizar a campanha da chapa 3, com o número maior de participantes, e da chapa 1, que tentava a reeleição. Com o caminho livre, o grupo conseguiu um maior diálogo com os alunos, principalmente aqueles que antes se abstinham do processo eleitoral.
Propostas
As propostas do grupo Aliança pela Liberdade, vão, em parte, na contramão das reivindicações do movimento estudantil. A mais polêmica delas é a defesa de parcerias público-privadas na pesquisa acadêmica. Raul afirma que a ideia ganhou força entre os alunos em parte porque quem é contra não soube apontar caminhos novos. “O movimento estudantil é historicamente contrário à presença das fundações. Na UnB, depois do caso da Finatec, o assunto ganhou mais destaque. Mas o Ministério da Educação aumentou a importância e a participação delas. No entanto, o movimento não soube apresentar soluções”.
Para André, quem critica a proposta afirmando ser uma privatização da universidade, não entendeu a ideia. “Temos mentes brilhantes aqui na UnB e podemos aproveitar esta capacidade para investir em mais produção acadêmica, em mais pesquisa. A UnB merece sim ter investimentos privados. Mas claro, tudo deve ser feito com transparência, para que o processo seja legítimo”, diz.
Outra proposta controversa é a defesa da presença da Polícia Militar nos campi, como forma de aumentar a segurança dos alunos. Atualmente, a Universidade de São Paulo (USP) enfrenta uma reação dos estudantes à detenção de três estudantes após terem sido flagrados fumando maconha. Na UnB, há, desde 2008 uma discussão acerca da melhor forma de se garantir mais segurança, mas a presença da PM é um ponto controverso entre os estudantes.
O grupo também defende a melhoria da infraestrutura de todos os campi. O projeto envolve a reparação de salas de estudo e de laboratórios, além do fornecimento de papel higiênico e de toalhas de papel em todos os banheiros. As empresas juniores também serão apoiadas e a criação de um parque tecnológico está entre as propostas a serem pleiteadas junto à Reitoria. Além disso, eles também querem que haja mais concessões para a instalação de lanchonetes e papelarias no câmpus Darcy Ribeiro. Esta última proposta foi bastante criticada pelos oposicionistas que defendem a melhoria e ampliação do Restaurante Comunitário.
Para auxiliar na gestão, o grupo quer implantar um sistema parlamentarista para o DCE. A ideia é que cada centro acadêmico eleja um representante para compor uma espécie de “assembleia”.
Parabens para a universidade e para os alunos. É triste ver que a esquerda raivosa não aceita a pluralidade de ideias e querem vencer no grito em flagrante desrespeito a democracia. Estudei engenharia e entendo perfeitamente que coerência e inteligência não fazem parte do perfil do esquerdista entao eles tentam compensar com o grito.
“Honestino era comunista”… Como, se era da AP? No movimento estudantil sempre houve esse confronto entre os comunistas, do PCB, e os católicos, da AP.
Todos esses grupelhos eram comunistas, mais ou menos radicais. Todos rezavam na decrépita cantilena marxista, basta ver os estatutos (que jamais mencionaram a palavra “democracia”).