Renata Camargo
O Congresso Nacional caminha a passos largos para reduzir os limites obrigatórios de áreas ambientais protegidas no país. Dos 17 projetos em tramitação no Legislativo que alteram diretamente o limite das áreas de proteção permanece (APP) e reserva legal, 14 preveem a redução de áreas ambientais ao longo dos cursos d’água ou a diminuição de áreas de uso sustentável de recursos naturais em propriedades rurais. Apenas três sugerem o aumento desses limites.
O movimento para afrouxar a legislação ambiental é suprapartidário, envolve parlamentares de sete legendas. Metade das sugestões foi apresentada por congressistas do PSDB (4) e do PMDB (3). As outras foram propostas por deputados e senadores do DEM (2), do PT (2), do PSB (1), do PDT (1) e até do PV (1).
Veja a lista dos projetos que reduzem as APPs e/ou as reservas legais
O conteúdo dos projetos apresentados varia, mas abrange reduções de áreas de proteção em meio rural e urbano. Duas propostas, ambas de parlamentares de São Paulo – uma do deputado Guilherme Campos (DEM) e outra do deputado Dr. Ubiali (PSB) –, privilegiam, inclusive, donos de clubes de lazer e recreação, retirando os limites para áreas de preservação permanente e tornando legal um dispositivo que não é cumprido pelos proprietários desses empreendimentos.
Os dados fazem parte de levantamento do Congresso em Foco, que apresenta hoje (13) a segunda reportagem da série sobre como o Parlamento brasileiro lida com a questão ambiental. Ontem, este site mostrou que forças atuam contra as conquistas do meio ambiente no Congresso (leia mais).
Os ruralistas afirmam que a legislação ambiental está descontextualizada e contraria as necessidades econômicas do país. Os principais pontos de discórdia estão nos limites destinados às áreas de preservação permanente. A legislação prevê, por exemplo, que pelo menos 30 metros de mata ao longo dos rios têm de ser preservados e limita a 20% o desmate em propriedades rurais na Amazônia.
Ônus social
Representantes do setor agropecuário justificam que a reserva legal transfere para o produtor rural um ônus social que deveria ser compensado economicamente, como por pagamentos de serviços ambientais, por exemplo. Eles afirmam, ainda, que as áreas de preservação inviabilizam economicamente a produção, pois diminuem drasticamente o terreno em que é permitido o cultivo, e levam produtores para clandestinidade.
“Se aplicarmos a atual legislação ambiental, nós praticamente impediremos um grande número de produtores de todo o Brasil de permanecerem na atividade. No Rio Grande do Sul, por exemplo, nós temos em torno de 430 mil propriedades. Se aplicarmos a lei, certamente, 120 mil propriedades param de produzir, pois parte delas é de plantios centenários em encostas e morros, o que é proibido por lei”, justifica o deputado Luiz Carlos Heinze (PP-RS), integrante da bancada ruralista no Congresso.
Segundo dados da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), 80% da produção de uva no Rio Grande do Sul, principal produtor da fruta no país, estão em áreas de declive. O mesmo ocorre com cerca de metade da produção de café em Minas Gerais. Em Santa Catarina, 51% das maçãs produzidas no estado estão localizadas em áreas de preservação permanente.
“Nós queremos basicamente que as áreas consolidadas sejam respeitadas na quase totalidade. Se há 100 anos as lavouras de arroz e de fumo do Rio Grande do Sul estão ali e não prejudicaram o meio ambiente, por que retirá-las hoje? Depois veremos o que podemos ajustar”, considerou Heinze.
Um estudo da WWF Brasil, apresentado em julho deste ano, mostra que é possível dobrar a área da agricultura nacional somente recuperando áreas de pastagem degradadas. De acordo com os dados do estudo, há aproximadamente 200 milhões de hectares de pastagem no Brasil. Desses, 30% estão degradados, o que representa uma área de cerca de 70 milhões de hectares que potencialmente podem servir para expandir a fronteira agrícola, sem precisar reduzir áreas de preservação ou causar novos desmatamentos.
Código no papel
O Código Florestal foi editado em 1965 e determinava que, ao longo de rios e outros cursos hídricos, as áreas de proteção permanente variassem de acordo com a largura do corpo hídrico. Os limites iam de cinco metros, para cursos d’água com menos de 10 metros de largura, a 100 metros, para rios com largura superior a 200 metros.
Em 1989, o Congresso aprovou uma lei que aumentou as APPs. Passaram a vigorar os limites de 30 metros, para rios com 10 metros de largura, e até 500 metros para rios superiores a 600 metros de largura.
A área de reserva legal também foi alterada para ampliar o espaço de proteção ao longo dos anos. O Código Florestal, em sua redação original do art. 44, determinava que, enquanto não fossem regulamentados em definitivo os limites da reserva legal, só seria permitido desmatar se pelo menos metade da área fosse preservada. A expressão reserva legal foi introduzida pela Lei 7.803 de 1989, que estabeleceu um limite de 50% para as propriedades da região Norte.
Onze anos depois, em 2000, a Medida Provisória 1.956-50 alterou os percentuais. Aumentou para 80% em propriedades situadas na Amazônia Legal e 35% para propriedades situadas no cerrado localizado na mesma região. No ano seguinte, a MP 2.166-67 manteve os mesmos percentuais, permanecendo também os 20% de reserva legal em propriedades localizadas fora da Amazônia.
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