Diego Moraes
O vendaval que arrastou o ex-presidente da Câmara Severino Cavalcanti (PP-PE) de Brasília para o interior de Pernambuco não levou pra lá outro ilustre pernambucano envolvido na história do mensalinho. Acusado pelo empresário Sebastião Buani de ter intermediado a renovação do contrato irregular de exploração do restaurante do anexo 4 da Câmara, o deputado Gonzaga Patriota (PSB-PE) se abrigou no semi-anonimato para se livrar de um processo de cassação.
Sem a expressão política do conterrâneo, Patriota deve escapar da fúria investigatória dos colegas. O nome dele, no entanto, aparece no inquérito policial aberto pela Polícia Federal para apurar a denúncia contra Severino. “Não tem nada ainda por aqui e não vi se há algum movimento na Casa para encaminhar algo”, afirmou o presidente do Conselho de Ética, Ricardo Izar (PTB-SP).
Apenas a mesa diretora e os partidos políticos podem entrar com representação contra um parlamentar. Disposição que ninguém apresentou até o momento e que parece remota com a efervescência criada em torno da eleição do novo presidente da Câmara. Segundo depoimento de Buani à PF, Patriota teria redigido o documento que permitiria à rede Fiorella continuar explorando o restaurante da Câmara. Procurado pelo Congresso em Foco, o deputado não retornou nenhum dos contatos feitos.
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O papel se revelou sem valor jurídico, mas a conta, segundo o dono do restaurante, saiu salgada: R$ 40 mil. De acordo com o empresário, a quantia seria rateada entre Severino e Patriota. Buani ressalta, no entanto, que não sabe se o dinheiro foi repassado ao deputado do PSB.
“Estava subindo a esteira para ir ao Anexo 4, quando encontrei o deputado Gonzaga Patriota. Comentei a ele: ‘Estou com um pedido (de assinatura do contrato) lá na mesa do primeiro secretário e o senhor, que é amigo dele, poderia ver se pode dar uma decisão final, ou pode ou não pode, ou é de lei ou não é’. Pouco tempo depois, recebi um telefonema para comparecer ao gabinete de apoio do primeiro secretário”, contou o empresário.
PublicidadeTraído pela memória
Desde a divulgação do escândalo, Patriota deu várias versões para o caso. Procurado pela revista Veja, autora da primeira reportagem de capa sobre o assunto, disse num primeiro momento que mal conhecia Buani. Com o desenrolar das investigações, porém, admitiu ter ajudado na elaboração do documento que prorrogaria a concessão do restaurante.
"Como sou advogado, dei orientação dizendo que ele (Buani) tinha direito à renovação. Não sei se eu mesmo fiz ou mandei para ele a fundamentação.Mas não foi nada de Justiça, não. Foi apenas um requerimento administrativo. Fundamentei que ele tinha direito à renovação do contrato de acordo a lei tal, tal e tal… Foi só isso", confirmou depois, em nova entrevista à Veja. O deputado, no entanto, negou ter recebido qualquer compensação financeira pela ajuda. "Ele nunca me deu um centavo. Ajudei apenas por ajudar. (…) Na verdade, só comecei a lembrar disso agora… Eu fiz um favor porque ele empregou algumas pessoas que eu pedi. Foi um favor pagando outro favor", completou.
O mensalinho, segundo Buani, foi proposto por Severino para prorrogar o contrato de concessão do restaurante, já que o documento elaborado com a ajuda de Patriota não tinha valor jurídico. A partir daí, o então primeiro-secretário teria recebido R$ 10 mil mensais. O nome de Patriota, no entanto, não aparece nos demais capítulos da história que resultou na derrocada do “rei do baixo clero”.
Oposição se cala
Os partidos de oposição, que uniram esforços para representar contra o ex-presidente da Câmara no Conselho, não têm a mesma pressa para investigar o parlamentar do PSB. “No PV, ninguém pretende representar contra ele (Gonzaga) por enquanto”, afirmou o deputado Fernando Gabeira (PV-RJ). Um dos líderes do movimento de “caça a Severino”, o parlamentar fluminense não manifesta a mesma disposição contra Patriota. “Fica a cargo do Conselho de Ética decidir se abre processo ou não”, completou.
“Deixo essa decisão para os parlamentares”, rebateu o presidente do Conselho, ao ressaltar que não tem competência para propor, sozinho, a abertura de um processo. O líder do PFL na Câmara, Rodrigo Maia (RJ), também sinalizou que seu partido não pretende entrar com representação contra Patriota. “Não há provas contra ele, somente o depoimento de Buani”, argumenta o pefelista.
Segundo Maia, os parlamentares estão dispostos a apurar todos os possíveis envolvidos no esquema denunciado pelo empresário, mas o rumo das investigações ainda não foi definido. “Isso vai ser decidido no colégio de líderes. No PFL, que eu saiba, não há nenhum movimento para representá-lo no Conselho”, reforça o parlamentar.
O líder do partido de Patriota, Renato Casagrande (ES), sai em defesa do colega Segundo ele, Buani desmentiu, em depoimento à Polícia Federal, as acusações de que o parlamentar teria participado do esquema de mensalinho. “Esse era o único fato que poderia incriminar o Patriota. Fora isso, não há nenhuma outra evidência”, afirmou.
Indícios insuficientes
Para Casagrande, um processo de cassação contra o pernambucano só será aberto caso a Polícia Federal, responsável pelas investigações, apresente indícios que possam envolver o parlamentar no esquema. “Não se pode apresentar uma representação contra um deputado sem nenhuma prova”, enfatizou o líder do PSB.
A abertura de um processo de cassação contra o deputado Gonzaga Patriota é algo bastante improvável, na opinião do cientista político José Castro Neves. Segundo ele, as denúncias de Buani serviram como pretexto para que os partidos de oposição articulassem a saída de Severino da presidência da Câmara. Depois disso, as investigações sobre o mensalinho devem perder espaço para as dezenas de denúncias apuradas pelas CPIs dos Correios e do Mensalão.
“Acho pouco provável que ele (Patriota) seja investigado ou cassado. Não há provas concretas contra ele, como há contra Severino. Além disso, Severino era o alvo. Qual o benefício de tirar o Patriota da Câmara?”, observou Neves.
O cientista acredita que Patriota também foi favorecido pelas contradições dos depoimentos de Buani. “As informações do empresário não batem com muitas das provas que já apareceram. Ainda não está claro quem pagou e quem recebeu e, nessa lógica, não há como atestar a participação do deputado no esquema”, afirmou Neves.
Beneficiado pelo foro privilegiado, prerrogativa que garante a autoridades o direito de terem suas investigações submetidas ao Supremo Tribunal Federal (STF), Patriota pode dar abrigo jurídico a Severino. Por causa da inclusão de seu nome no inquérito do mensalinho, os advogados do ex-presidente da Câmara tentam impedir que as investigações desçam para a primeira instância, como ocorre no caso de apurações contra ex-parlamentares.
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