Ricardo Ramos
Em meio à maior crise do governo Lula, a articulação política do Palácio do Planalto terá esta semana um desafio triplo pela frente: retomar a presidência da Câmara, mudar pontualmente as regras das próximas eleições e evitar a debandada de aliados. Acaba nesta sexta-feira (30) o prazo para que os parlamentares que desejam disputar as eleições de 2006 troquem de partido. Ninguém se arrisca a cravar números, mas é dado como certo o encolhimento da base governista.
Atingidos diretamente pela crise, o PT, o PP, o PL e o PTB devem perder quadros para o PPS, o PDT, o PSB, o PSOL, o PSDB, o PFL e o PMDB, aumentando o bloco de oposição e dos parlamentares que se declaram independentes em relação ao Planalto. As mudanças devem transferir dos petistas para o PMDB a condição de maior bancada da Casa.
Com 87 deputados – um a menos que o PT –, os peemedebistas esperam o ingresso de sete a 10 parlamentares até sexta-feira. “Estamos recebendo adesões por gravidade”, diz o vice-líder do PMDB Adelor Vieira (SC). Desde o início desta legislatura, em fevereiro de 2003, o partido foi o que mais ganhou cadeiras na Câmara: 17. É o mesmo número de assentos que, na outra ponta, o PFL perdeu nesse período. Desde fevereiro de 2003, a Câmara registrou 236 trocas partidárias. Dos 513 deputados, 145 já mudaram de legenda.
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O PT, que desde o seu nascimento até a crise política, conheceu apenas o caminho do crescimento, começou a definhar. Depois de perder na semana passada para o PSOL o deputado João Alfredo (CE), o PT pode ficar sem outros nove representantes, que participaram nesse fim de semana de uma teleconferência para decidir o futuro político. O resultado das discussões só deve ser anunciado amanhã.
“É uma decisão traumática”, afirma Chico Alencar (PT-RJ). “Permanecer com tudo o que a gente vem sofrendo é complicado”, completa. Além dele, estudam a possibilidade de deixar o partido os deputados Paulo Rubem Santiago (PE), Walter Pinheiro (BA), Nazareno Fonteles (PI), Maninha (DF), Ivan Valente (SP), Orlando Fantazzini (SP), Dra. Clair (PR) e Mauro Passos (SC), todos da ala esquerda.
PublicidadeA acirrada disputa pelo comando do PT, cuja definição só deve ocorrer no próximo dia 9, com a realização do segundo turno, pôs por terra a pretensão do grupo que faz oposição ao Campo Majoritário de só anunciar a debandada de acordo com o resultado das eleições internas. “Eles (do Campo Majoritário) não fizeram nenhum esforço para manter esses deputados. Quem faz isso são os militantes”, reclama Chico, ao revelar que, na quinta-feira passada, recebeu uma carta do teólogo Leonardo Boff pedindo a sua permanência no partido.
Barreira da cláusula
Além das questões regionais, duas mudanças na legislação eleitoral e um componente político serão decisivos para as movimentações partidárias desta semana: a diminuição da cláusula de barreira, de 5% para 2%, o fim das coligações partidárias nas eleições proporcionais e a eleição do presidente da Câmara.
A legislação privilegia os partidos com maior bancada na Casa ao conceder, numa coligação eleitoral, maior tempo de propaganda partidária nos meios de comunicação a essas legendas e verbas do fundo partidário. Para essas coligações, vale a quantidade de assentos no dia da posse.
Das duas alterações às regras eleitorais, a diminuição da cláusula de barreira, que ajudaria legendas pequenas mas tradicionais, como o PPS e o PCdoB, é a que mais tem chance de ser aprovada. Caso consiga reduzir esse porcentual, o recém-criado Partido Municipalista Renovador (PMR), ligado à Igreja Universal do Reino de Deus, poderá atrair insatisfeitos do PL.
Reforma às pressas
Os líderes da Câmara e do Senado fazem um esforço concentrado para aprovar as mudanças eleitorais até sexta-feira. Para ganhar mais tempo para mexer na legislação, as lideranças devem aprovar uma proposta de emenda à Constituição que aumenta o prazo para que sejam feitas mudanças nas regras eleitorais: de 30 de setembro, o limite aumenta para 31 de dezembro. Contudo, a pedido dos próprios partidos, o troca-troca partidário ficou de fora da PEC.
A disputa pela presidência da Câmara, por sua vez, tende a consagrar as forças políticas com maior poder de fogo para as próximas eleições. Os três favoritos são José Thomaz Nono (PFL-AL), com o apoio dos tucanos, Michel Temer (PMDB-SP), que já presidiu a Casa, e Aldo Rebelo (PCdoB-SP), candidato bancado pelo Planalto.
Ganhando com a crise
Nos cacos da crise, o independente PDT vem faturando sobre os partidos da base aliada. Além do senador Cristovam Buarque (DF), ex-ministro do governo Lula, estão se juntando aos trabalhistas os deputados André Costa (RJ), ex-PT, Sérgio Miranda (MG), ex-PCdoB, Wagner Lago (MA), ex-PP, e Ademir Camilo (MG), do PL.
“Estava descontente com as pretensões políticas do PCdoB e com a rígida disciplina partidária”, afirma Sérgio Miranda, que militou no partido por 43 anos. “Eleitoralmente é um risco que corro, pois não tenho base no PDT”, admite o novo pedetista.
Assim como o PMDB, o PDT fez um convite ao vice-presidente da República, José Alencar, para ingressar no partido. O presidente do partido, Carlos Lupi, esteve no Planalto e conversou com Alencar durante uma hora e meia na última quinta-feira. “O PDT está de portas abertas para Alencar”, disse. Independente mas sem a estrutura partidária do PDT, o PPS ainda não demonstrou o mesmo poder de sedução dos socialistas.
Um dos poucos aliados do governo a não sair chamuscado com a crise, o PSB também deve inchar. Durante reunião da bancada na última semana passada, o líder Renato Casagrande (ES) anunciou a entrada de Mário Assad Júnior, João Paulo Gomes e Carlos Mota, todos ex-integrantes do PL mineiro.
Aliados em retração
Já o PP, o PL e o PTB, partidos de apoio ao governo cujas lideranças foram frontalmente atingidas pelas denúncias dos últimos meses, tendem a minguar. No início da atual legislatura, esses partidos, que atraíram parlamentares de partidos de oposição, como o PSDB e o PFL, devem assistir a um movimento de retração.
“Estamos numa crise institucional”, afirma o deputado Ricardo Barros (PP-PR). “E esperamos que a situação dos nossos principais quadros seja resolvida rapidamente”, emenda. Ele cita a delicada fase por que passa o presidente do partido, Pedro Corrêa (PE), e o líder da bancada, José Janene (PR), acusados de serem beneficiários do mensalão. E do ex-presidente da Câmara Severino Cavalcanti (PE), que renunciou na quarta-feira passada ao cargo, após a revelação de que teria recebido propina para renovar a concessão de um restaurante da Casa.
Mesmo assim, Barros acredita que o sangramento da legenda acabou. “Quem já tinha que sair, já saiu”, garante. O deputado paranaense lembra que a disputa para a Câmara no próximo ano vai girar também em torno dos candidatos ao governo estadual.
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